Decorria o ano de 2003, quando numa dada noite entraram dois jovens pela porta do meu escritório, um era meu conhecido e colaborador ocasional, na área informática em que era e é um génio, o outro era-me completamente desconhecido. Depois das apresentações fiquei a saber que este último, o Francisco (nome fictício), era desenhador e maquetista, que estava na altura desempregado e à procura de ocupação.
Regra geral não costumo fazer juízos apressados sobre as pessoas baseando-me apenas no aspecto das mesmas, ou nas apresentações, mas algo me indicava que aquele jovem queria mesmo trabalhar. Por acaso tinha em mãos um trabalho que requeria uma maqueta e a conversa virou-se para o tema e depois de algumas trocas de impressões e do visionamento de umas plantas, decidi entregar-lhe o trabalho.
Dentro do prazo previsto, o Francisco entregou-me o trabalho feito, bastante rigoroso e com uma qualidade irrepreensível, pelo que continuei a recorrer aos seus serviços daí em diante. Durante dois anos manteve-se esta colaboração perfeita, e comecei a conhecer o pessoalmente o Francisco, que era um jovem calmo, muito bem educado, bastante sério e algo reservado, que namorava uma moça lindíssima, a Ana (nome também fictício) que algumas vezes o acompanhava nas visitas ao escritório e à minha casa.
No mês de Novembro de 2005, recebo a altas horas da noite um telefonema do António, o amigo que nos tinha apresentado, dizendo que o Francisco tinha morrido há poucas horas. Fiquei espantado com a notícia, tanto mais que já há três ou quatro semanas lhe tinha perdido o rasto, porque ele não me respondia nem aos telefonemas nem aos mails, e no último contacto que tínhamos tido, me dissera que estava a pensar em casar com a Ana. Mais confuso fiquei ainda quando tive conhecimento que se tinha suicidado.
Os familiares nada me adiantaram sobre o assunto na altura, e tanto a Ana como o António, amigos mais chegados também pareciam não saber nada sobre o assunto. Passados dois anos, num encontro casual com estes dois amigos, a Ana e o António, fizeram questão de abordar o assunto, coisa que nunca tínhamos feito durante esse tempo, e disseram-me que o Francisco se tinha suicidado poucos dias depois de ter tido conhecimento de que estava infectado com o vírus da Sida. Fiquei siderado.
Ele tinha tido um pequeno acidente no seu estúdio, e foi ao hospital para ser cozido num corte numa mão, e a costura acabou por infectar. Voltou ao hospital dois dias depois e ter-lhe-ão feito análises ao sangue enquanto o tratavam, como a ferida continuou a dar problemas voltou lá novamente e acabou por ser informado que estava infectado. Destroçado voltou a casa, onde a notícia caiu com estrondo, e a família reagiu negativamente, ao que me foi dito.
Alguns dias depois, enviou uma carta à Ana, que a recebeu apenas no dia da cremação, contando-lhe detalhadamente o sucedido, pedindo-lhe desculpas por tudo (erros do passado), e dizendo que se sentia incapaz de encarar amigos e conhecidos depois de saber que estava infectado, e que iria pôr termo à vida logo de seguida, como o veio a fazer.
Não consigo condenar este acto, nem sei como reagiria em situação análoga. Lamento o sucedido, perdi um amigo, fiquei mais alerta para este problema, e mais sensível ao sofrimento de quem dele padece, e dos que os rodeiam e sofrem igualmente.
Regra geral não costumo fazer juízos apressados sobre as pessoas baseando-me apenas no aspecto das mesmas, ou nas apresentações, mas algo me indicava que aquele jovem queria mesmo trabalhar. Por acaso tinha em mãos um trabalho que requeria uma maqueta e a conversa virou-se para o tema e depois de algumas trocas de impressões e do visionamento de umas plantas, decidi entregar-lhe o trabalho.
Dentro do prazo previsto, o Francisco entregou-me o trabalho feito, bastante rigoroso e com uma qualidade irrepreensível, pelo que continuei a recorrer aos seus serviços daí em diante. Durante dois anos manteve-se esta colaboração perfeita, e comecei a conhecer o pessoalmente o Francisco, que era um jovem calmo, muito bem educado, bastante sério e algo reservado, que namorava uma moça lindíssima, a Ana (nome também fictício) que algumas vezes o acompanhava nas visitas ao escritório e à minha casa.
No mês de Novembro de 2005, recebo a altas horas da noite um telefonema do António, o amigo que nos tinha apresentado, dizendo que o Francisco tinha morrido há poucas horas. Fiquei espantado com a notícia, tanto mais que já há três ou quatro semanas lhe tinha perdido o rasto, porque ele não me respondia nem aos telefonemas nem aos mails, e no último contacto que tínhamos tido, me dissera que estava a pensar em casar com a Ana. Mais confuso fiquei ainda quando tive conhecimento que se tinha suicidado.
Os familiares nada me adiantaram sobre o assunto na altura, e tanto a Ana como o António, amigos mais chegados também pareciam não saber nada sobre o assunto. Passados dois anos, num encontro casual com estes dois amigos, a Ana e o António, fizeram questão de abordar o assunto, coisa que nunca tínhamos feito durante esse tempo, e disseram-me que o Francisco se tinha suicidado poucos dias depois de ter tido conhecimento de que estava infectado com o vírus da Sida. Fiquei siderado.
Ele tinha tido um pequeno acidente no seu estúdio, e foi ao hospital para ser cozido num corte numa mão, e a costura acabou por infectar. Voltou ao hospital dois dias depois e ter-lhe-ão feito análises ao sangue enquanto o tratavam, como a ferida continuou a dar problemas voltou lá novamente e acabou por ser informado que estava infectado. Destroçado voltou a casa, onde a notícia caiu com estrondo, e a família reagiu negativamente, ao que me foi dito.
Alguns dias depois, enviou uma carta à Ana, que a recebeu apenas no dia da cremação, contando-lhe detalhadamente o sucedido, pedindo-lhe desculpas por tudo (erros do passado), e dizendo que se sentia incapaz de encarar amigos e conhecidos depois de saber que estava infectado, e que iria pôr termo à vida logo de seguida, como o veio a fazer.
Não consigo condenar este acto, nem sei como reagiria em situação análoga. Lamento o sucedido, perdi um amigo, fiquei mais alerta para este problema, e mais sensível ao sofrimento de quem dele padece, e dos que os rodeiam e sofrem igualmente.
21 comentários:
Uma historia comovente sem dúvida. Uma vez tive uma história parecida mas com um amigo que era critico de arte. Ainda hoje não sei a juízo certo qual foi a causa do seu suicídio. Passou-se nos anos oitenta e resume-se ao seguinte: ele emprestou-me um livro sobre teoria de arte e nunca mais contactou nem aparecia no café onde o nosso grupo se reunia, como há muito que não aparecia pensávamos que estava em França onde passava temporadas. Entretanto eu fui para fora de Portugal durante dois anos e quando cheguei tive necessitava de falar com ele e pretendia também entregar-lhe o livro qual foi o meu espanto quando ao perguntar por ele para a sua casa me perguntaram quem eu era? Eu respondi que era o António Delgado e era um amigo da universidade. Depois responderam-me: mas não sabe ele morreu: suicidou-se com uma corda, fazia quase três anos? Eu com a voz seca e tremula respondi: desculpe não sabia e peço desculpa pela inoportunidade . Não pode imaginar o flash que senti. Nós os amigos supomos que ele se suicidou devido a uma crise sentimental.
Um abraço
António Delgado
Tinhas que me fazer chorar Zé!!
E de caminho lembraste-me de um compromisso que tenho e que ainda não dei seguimento...falha minha sem perdão.
Bom domingo
beijão grande
Um texto que emociona. O suicídio de alguém é sempre algo que choca e deixa-nos perplexos, sem saber o que dizer e até os sentimentos ficam emaranhados.
Te deixo um abraço e o desejo de um bom domingo.
Não vou comentar o teu post pq é mt pessoal.
Atão e as t-shirts agradaram aos teus amigos? :-)
Bjs de bom domingo
Zé Povinho
Primeiro que tudo meu amigo abraço-te por teres abraçado esta causa que está a ser debatida no Sidadania e exactamente este post vem de encontro à vertente do debate: a quem contar quando se é infectado e que apoios são disponibilizados ao doente (seja este ou outro)quando está perante uma situação irredutível.
Vou fazer uma chamada no Sidadania, cujo debate estou a moderar a pedido do Raul, para este teu post. Pedia-te por isso que mantivesses o post mais um dia ou dois.
Amigo, deixa-me que assim te trate, o realismo com que contaste este caso deixou-me profundamente comovida. Conheci alguns casos mas nenhum teve o desfecho deste.
Bem hajas por teres conseguido relatá-lo desta forma, perpassado de sentimento que me atingiu e que , certamente, não deixará indiferente ninguém que te leia.
Beijinhos
Gostei do texto que publicaste.Embora relate um drama e quando a morte está presente é sempre triste, ele despertará as mentes daqueles que teimam em considerar a infecção pelo HIV, como uma doença que já não causa grandes problemas.
Infelizmente esse teu amigo não é caso único e eu conheço alguns casos que tiveram o mesmo desfecho.
O Sidadania sente-se feliz com a iniciativa "Um texto sobre SIDA",e textos como o que aqui publicas, mostram que muitos autores de blogues tiveram a pandemia a cruzar-se no seu caminho através de familiares, amigos ou simplesmente pesssoas conhecidas.
É necessário continuar a lembrar que a SIDA existe e continua a desvastar vidas.É necessário as pessoas mentalizarem-se que sem data nem hora marcada ela pode cruzar-se nas suas vidas e necessitam estar preparados para enfrentar a fera. Bem hajas por ter trazido este tema ao teu blogue.
Um abraço do Raul
Nem sei o que dizer, apenas que por vezes o preconceito mata mais do que a doença.
os meus sentimentos e um abraço.
Uma história forte que para mais forte não é história e pode ser de todos nós. Fazes bem em divulgar porque ainda temos presente o estigma da SIDA e uma doença não é um relatório que julgue o seu portador, pelo contrário. Lamento sempre, nestas situações, o desespero de quem opta por terminar a sua vida porque tenho sempre aquela esperança patética de uma cura descoberta de repente. Mas não sei, nenhum de nós sabe, o que é apanhar com uma sociedade hiper-crítica em cima e com níveis de sofrimento incalculáveis. Um grande abraço, lamento muito a tua perda.
Olá Zé,
É extraordinário este relato de vida e ainda bem que o publicou já que esta perspectiva do problema ainda não havia sido dada por nenhum blog, se não estou em erro.
Eu compreendo a decisão do Francisco.
Viver obriga a muita coragem, quantas vezes se não, contra tudo e contra todos, pelo menos, sozinho, entre todos...
A fuga é muitas vezes a via menos dolorosa.
Isto pode cruel, mas é verdade.
Daí a importância de alimentar-mos reciprocamente a nossa coragem e determinação para enfrentar as armadilhas que nos vão confrontando ao longo da vida e de alimentar-mos o nosso espírito de solidariedade, tendo sempre presente que todos possuímos a mesma essência e por vezes certas infelicidades são só uma questão de circunstância que hoje não é a nossa ...
Parabéns pelo seu texto.
Um beijinho muito amigo
da
Maria
A vida tm estas estórias que nos dexa um nó na garganta, em respostas nem pergnta. só equações
Sudações amigas
Uma história assim contada que me comoveu e me levou às lágrimas.
Beijo
Uma de muitas histórias... é necessário informação muita informação. Um Abraço
Zé Povinho, Zé Povinho
que texto mais comovente
que revela bem que a sida
ainda assusta muita gente.
E porque deve assustar
mais que qualquer outra doença
se até não é das piores
e há muito quem a vença?
Só porque há aí uns horrores
de gente que não tem presença
a não ser quando castiga
com a Divina Providência?
Zé Povinho, Zé Povinho
meu amigo e companheiro
vamos sempre no caminho
que seja o mais verdadeiro.
Não voltaremos a cara
a quem está a sofrer,
e olharemos com amizade
o pobre que não tem que comer.
Zé Povinho, Zé Povinho
esta causa há-de vencer.
Sobre o que está a acontecer no "As Vicentinas de Braganza", agradecia que nos visitassem, e se pronunciassem, caso vos interesse o nosso novo dilema/problema
http://asvicentinasdebraganza.blogspot.com/2008/04/nota-constitucional.html#links
Sei que não te foi fácil contar isto,e é por esse motivo que aqui venho dizer que deste um bom contributo para o conhecimento dos dramas que estão por vezes associados às doenças e à intolerância.
Bjos
Rita
Uma historia comovente, sem palavras...
Oi Zé,
Impressionante este teu testemunho... desde que me cruzei com o Raul do Sadadania, que tenho lido , um pouco por todo o lado casos vividos na 1ª pessoa, cada um com a sua carga ...
acabam por me faltar as palavras ... sem saber bem o que dizer ...
mas o que podemos dizer sobre estas situações?
beijinhos
Um caso humano, triste, mas revelador do choque que uma notícia dessas pode provocar num ser humano que, de repente,vê desabar o mundo perante si e fica sem qualquer capacidade de resposta.
Uma tragédia humana, de contornos absolutamente reais e que, pessoalmente, consigo compreender.
Como o Zé, também eu não sei dizer o que faria em idênticas circunstâncias.
Um abraço.
Jorge P.G.
Olá meu querido amigo Zé, acabei de ler o teu texto, e estou sem palavras com um nó na garganta, com vontade de chorar...É assim a vida!
Tanto preconceito para quê ?
Ainda bem que tiveste coragem para escrever este caso!
Amigo uma boa semana e muitos beijinhos de carinho,
Fernandinha
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