sexta-feira, dezembro 16, 2011

ALBERTO CAEIRO

Se às Vezes Digo que as Flores Sorriem

Se às vezes digo que as flores sorriem
E se eu disser que os rios cantam,
Não é porque eu julgue que há sorrisos nas flores
E cantos no correr dos rios...
É porque assim faço mais sentir aos homens falsos
A existência verdadeiramente real das flores e dos rios.
Porque escrevo para eles me lerem sacrifico-me às vezes
À sua estupidez de sentidos...
Não concordo comigo mas absolvo-me,
Porque só sou essa cousa séria, um intérprete da Natureza,
Porque há homens que não percebem a sua linguagem,
Por ela não ser linguagem nenhuma.

Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos



FOTOGRAFIA MANIPULADA

6 comentários:

Anónimo disse...

Que dizer de Pessoa que ainda não tenha sido dito?
Adorei a fotografia, que me fez recordar a exposição com trabalhos do Palaciano em Madrid.
Bjos da Sílvia

LopesCaBlog disse...

Bonito :)

José Leite disse...

Fernando Pessoa na sua metamorfose...

Pata Negra disse...

Nem de propósito, acabo de receber a prenda de Natal de um colega de trabalho: uma fotocópia muito mal tirada da pág.127 dum livro do desassossego.
Um abraço em Pessoa

Anónimo disse...

Cara Sílvia
A imagem é minha, e esteve em Madrid, bem como outras que os dois malandros têm agora à disposição para alegrar os blogues.
Palaciano

Unknown disse...

"A vida prejudica a expressão da vida. Se eu tivesse um grande amor nunca o poderia contar.

Eu próprio não sei se este eu, que vos exponho, por estas coleantes páginas fora, realmente existe ou é apenas um conceito estético e falso que fiz de mim próprio. Sim, é assim. Vivo-me esteticamente em outro. Esculpi a minha vida como a uma estátua de matéria alheia ao meu ser. Às vezes não me reconheço, tão exterior me pus a mim, e tão de modo puramente artístico empreguei a minha consciência de mim próprio. Quem sou por detrás desta irrealidade? Não sei. Devo ser alguém. E se não busco viver, agir, sentir, é - crede-me bem - para não perturbar as linhas feitas da minha personalidade suposta. Quero ser tal qual quis ser e não sou. Se eu cedesse destruir-me-ia. Quero ser uma obra de arte, da alma pelo menos, já que do corpo não posso ser. Por isso me esculpi em calma e alheamento e me pus em estufa, longe dos ares frescos e das luzes francas - onde a minha artificialidade, flor absurda, floresça em afastada beleza."

(Fernando Pessoa)