“… As caçadas eram também uma diversão muito apreciada pela Corte, e a ellas era muito affeiçoado El-Rei D. Manoel. Diz-nos ainda o seu chronista: « Deleitava-se muito no monte e era um bom besteiro e caçador de vontade, pêra o que tinha muito lebreus e sabujos e outros cães, com muitas e boas aves de presa de diversas raças que mandava vir de fóra do seu Reino. Mas ao montear e caça do gavião era mais inclinado do que à caça dos falcões. Nunca ía à caça sem levar musicas e instrumentos de camara, com que lhe tangiam e cantavam fóra no campo ou nas casas onde comia ou repousava».
Espectáculo verdadeiramente curioso e pitturesco o da partida d’este Rei, em tudo ostentoso e magnificente, dos Paços de Cintra para uma caçada em que era acompanhado de numeroso séquito! Pelo pateo vêem-se as matilhas dos delgados lebreus seguros pelas trelas, impacientes por partirem; escuta-se o latir dos sabujos fustigados pelos moços do monte; o relinchar dos ginetes destinados a El-Rei, a todos os Senhores da Corte, e aos duzentos cavalleiros de sua casa que o acompanhavam sempre; as pragas dos moços da estribeira e dos moços das esporas, a quem os carcundas e chocarreiros reclamam pacíficas mulas para os conduzirem; a azafama dos músicos e menestréis que seguem a caçada; e por último El-Rei D. Manoel descendo dengosamente a escadaria, seguido do Barão de Alvito, Prior do Crato, D. João de Menezes, pelo estribeiro-mór Francisco Homem, e por tantos outros, alegre, prazenteiro, calçando luvas de anta, e com um gesto despedindo-se da Rainha D. Maria, que apparece na grande janella da fachada em companhia da camareira-mór, emquanto que pelas adufas das habitações das damas apparecem cabecinhas curiosas, seguindo com o olhar alguns dos personagens da vistosa e apparatosa scena.”
Texto d’O Paço de Cintra do Conde de Sabugosa (1903)
Fotos by Palaciano
12 comentários:
E hoje temos um tema histórico, as caçadas reais,uma das principais ocupações dos nobres em tempo de paz. A caça terá sido uma das primeiras actividades do homem ,quando era nómada, e estendeu-se até aos nossos dias.
Um "desporto" caro que não me é caro.
Quanto aos azulejos, um documento histórico importante,em azul e branco são lindos.
Beijinhos
Um acontecimento, a partida do rei para a caça como se pode ver pela descrição. A sumptuosidade e a ostentação são duas características do reinado de D. Manuel. O ouro da África e os produtos do Oriente viabilizavam este tipo de vida.
Beijinho
Amigo Zé,
Hoje consegui vir ler-te e depois das peripécias dos posts anteriores, estive a ler esta descrição das caçadas como quem vê um filme. Uma viagem a outros tempos.
E à espera que este Agosto acabe depressa, te deixo um grande abraço.
Saudades
Nessa altura caçavam. Agora, o que fazem os nossos homens do poder para se entreterem? Gostaria que pensássemos no assunto!
Como sempre o texto traz uma boa sobremesa de imagens!
Boa caçada
Zé
Sei que isto é a continuação da «resposta a pedido» de há uns dias, e que até sou a responsável desse artigo, mas como sempre és assertivo e fundamentas sempre bem a opinião, especialmente quando abordas assuntos culturais.
Bjos da Sílvia
Olá querido Zé, belíssima postagem!
O texto, as fotos, os cartoons uma maravilha Amigo... Aqueci o meu coraçao.
Beijinhos de carinho,
Fernandinha
Como um dos maiores monarcas do seu tempo, D. manuel tinha que levar um séquito condigno com o seu estatuto. Sempre excelentes as colaborações do Palaciano.
Um abrao.
Caçadas, reais ou senm ser reais, não me agradam. Sacrificar animais por divertimento, matar só pelo prazer de matar revolta-me.
Um abraço
Caros leitores(as)
A caça no séc XVI tinha uma finalidade que era alimentar as pessoas, e à época era ainda uma necessidade para muitos. As caçadas reais eram um divertimento da corte e também uma forma de afirmação de poder.
À luz do pensamento da época não era uma crueldade, embora hoje, e nestes moldes, assim seja considerada.
Atenciosamente
Palaciano
Este texto é belissimo ...
é mesmo uma autência pintura ... não o conhecia e, adorei lê-lo.
beijinhos
olha gostei, muito bem.
Muito interessante esta passagem!
Azulejos lindos e cartoons, como sempre, muito bons.
Completamente contrário aos gostos pela caça tão comuns na época de D. Manuel, fico-me pela observação atenta do texto.
Um abraço.
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