segunda-feira, julho 30, 2012

A TRETA DA QUALIDADE

Este governo já nos habituou à “cantiga” do costume sobre a qualidade sempre que efectua cortes na educação e na saúde. De cada vez que fecha um serviço hospitalar ou uma urgência, salta o ministro a dizer que os utentes ficam a ganhar em qualidade. Quando fecham escolas, às centenas, temos o ministro da educação a afirmar a melhoria da qualidade do ensino. 

A qualidade acaba por ser o pretexto para os cortes sistemáticos na educação, saúde e justiça, mas é uma desculpa que não convence os que ficam mais longe dos serviços e não têm meios para lhes aceder sempre que necessário. 

Curiosamente a preocupação com os produtos alimentares é descurada tanto pela ASAE como pela DGAV, que por falta de meios ou por outra razão que me escapa não procedem nem à recolha de amostras nos matadouros nem ao seu controlo de qualidade. Claro que deve ser um mal menor na óptica dos nossos governantes, para quem a situação económica é muito mais importante do que a saúde da população em geral.

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O Talho do Coelho

sábado, julho 28, 2012

DESCULPA DE BANQUEIRO

O BCP que gosta de afirmar ser o maior banco privado português, apresentou no 1º semestre deste ano um prejuízo de 544,3 milhões de euros. São más notícias para os accionistas, para os clientes e até para os restantes portugueses, porque isto significa menos dinheiro disponível para o crescimento económico. 

O que foi incompreensível no anúncio feito pelo presidente do BCP, Nuno Amado, foi o facto de pelo meio das suas declarações, tenha surgido uma crítica ao Tribunal Constitucional, dizendo que tinha sido uma má decisão, a referente aos cortes dos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas, e até falta de bom senso. 

Nuno Amado sabe que os maus resultados do BCP nada têm que ver com os funcionários públicos ou pensionistas, mas sim com a exposição à dívida grega e à bolha imobiliária que o banco também promoveu, por isso as suas palavras soam falso. Mais estranho ainda porque o presidente do BCP até disse que não eram desejáveis mais impostos, o que não bate certo com a sua estranha referência ao TC.

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quinta-feira, julho 26, 2012

OPORTUNIDADE ARMADILHADA PARA GATUNOS

Depois do automóvel de Al Capone, eis que agora está também à venda a mansão do famoso mafioso americano. 

A mansão colocada agora à venda, é uma residência com sete quartos, uma casa de hóspedes e uma piscina em Miami Beach, que valerá cerca de 8,2 milhões de euros. 

 Esta oportunidade única está aberta a licitações de muitos malandros que têm as suas fortunas em paraísos fiscais, mas também tem o inconveniente de dar ao tesouro americano a oportunidade de taxar o seu proprietário, não de acordo com os rendimentos apresentados, mas pelo valor dos seus bens em terras do tio Sam, o que pode ser uma chatice. 

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terça-feira, julho 24, 2012

LÁGRIMAS DE CROCODILO

Tenho por princípio ler um pouco de tudo, mesmo quando não concordo de modo nenhum com as ideias dos autores, porque só assim me sinto à vontade para criticar alguns dos comentadores da nossa praça. 

Li no DN de ontem uma coluna de opinião com o título “ovo de crocodilo”, escrita por um comentador com formação em economia, e assumidamente católico. Podia acrescentar que é um apoiante entusiasta das medidas económicas deste governo, apesar de me basear apenas na minha opinião e nos seus escritos. 

Resumidamente o autor diz que caminhamos para o abismo, sem precaver os horrores seguintes, originados pela quebra de natalidade, e aponta como causa muito importante para esta situação a despenalização do aborto e a comparticipação nos actos médicos a quem recorre a esta solução. 

Penso que não recorreria ao aborto, em situação nenhuma exceptuando a má formação do feto ou em caso de risco de vida comprovado da mãe, mas nunca me passaria pela cabeça julgar alguém por ter recorrido ao aborto por questões que são do foro pessoal. 

O que me indigna em todo o artigo é que o autor, descarte a crise, o desemprego, e outras situações semelhantes, como causas da diminuição da natalidade, como se perante estes problemas os portugueses não possam tomar decisões conscientes para evitar trazer ao mundo filhos para os quais não se vislumbra futuro, ou que até nem existam condições materiais e relativa segurança para lhes dar uma vida decente com acesso ao que é essencial ao crescimento e formação. 

Em vez de sugerir que estamos todos a dormir, bem podia o comentador falar sobre quem nos conduziu ao buraco com más decisões políticas, sobre quem acha que a competitividade depende do valor dos salários, ou sobre quem aliciou todo um povo a gastar mais do que havia no país, nem que fosse com recurso ao endividamento. Hoje são os cidadãos normais e conscientes que mais moderam os seus gastos, mais colocam as suas parcas economias nos bancos e se limitam ao que é essencial. 

Os desempregados, os idosos e os jovens sofrem com a crise e até o têm feito em silêncio, bem ao contrário de muitos que nós conhecemos que continuam a comprar mansões milionárias, a adquirir carros de luxo e a passear-se por esse mundo fora. 

O senhor professor derrama umas quantas lágrimas de crocodilo, pois vira sempre as críticas sobre os que menos culpas têm, porque aos outro não o vejo criticar, mesmo quando se sabe que colocam os seus dinheiros lá fora para não pagar impostos no país onde ganham o seu dinheiro. 

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sexta-feira, julho 20, 2012

INSTITUIR A INJUSTIÇA

A descida da Taxa Social Única foi uma medida experimental tirada da cartola por este executivo que rapidamente arrepiou caminho, quando se apercebeu que era a certidão de óbito da Segurança Social e das pensões. Hoje, e devido ao perfeito “afogo” em que se encontra o mesmo executivo, para cumprir um programa de austeridade que esteve sempre condenado ao fracasso, a TSU volta à baila, agora defendida também pela troika. 

Talvez seja por acaso, coisa em que não acredito, fala-se na descida da TSU na mesma altura em que se apressa a venda dos seguros ainda dependentes da CGD, e portanto do Estado, bem como dos hospitais também pertencentes à CGD.

Já se ouviu falar que os aumentos brutais do IMI servirão para cobrir os 845 milhões de euros que os patrões deixarão de pagar de TSU, na contratação de jovens com salários nunca superiores a 600 euros, o que é no mínimo um convite ao patronato para despedir boa parte dos trabalhadores mais antigos e com vínculos definitivos, para os substituírem por mão-de-obra mais do que barata, e sem vínculos. 

Não há garantias de que a Segurança Social venha a ser compensada por esta perda de receitas, já que o Estado nunca cumpriu as suas obrigações nas transferências devidas, e não se está a contar com o aumento do desemprego resultante desta medida e deste convite à substituição dos trabalhadores com mais tempo de casa. 

Para piorar as coisas e acentuar as desigualdades, ao mesmo tempo que se dá uma mão às empresas, tira-se descaradamente dinheiro aos proprietários de casas que veem o valor tributário das suas casas aumentar diversas vezes, sem qualquer critério minimamente aceitável, numa altura em que o valor imobiliário desce a pique. 

Este país virou uma coutada de caça ao dinheiro de quem trabalha, em benefício de quem muito tem e de políticos que desgovernam o nosso dinheiro e nos fazem pagar pelos seus erros, sem qualquer vergonha.

quinta-feira, julho 19, 2012

A LEI DA SELVA NA EUROPA

Quando afirmo a minha discordância com esta Europa onde nos colocaram sem que para isso tivéssemos sido auscultados, em geral chamam-me retrógrado e extremista. Não me reconheço nesses rótulos, nem acho que esta Europa tenha sido construída democraticamente e com o aval dos cidadãos dos diferentes países que a compõem. 

À partida sabia-se que os diferentes países tinham graus de desenvolvimento diferentes e que era absolutamente imperioso tentar harmonizar as suas economias para o projecto ser bem-sucedido. Outra exigência indispensável era o acordo dos cidadãos nessa tarefa e nesse projecto conjunto. Como tudo foi feito sem a participação colectiva, o projecto esteve, desde o princípio, condenado ao fracasso, como se está agora a ver. 

Um antigo membro do BCE, de origem alemã, veio agora dizer, sem qualquer rodeio, que a zona euro deveria ser reduzida aos países economicamente estáveis, e que as economias mais fracas deveriam abandonar a moeda única. 

Alguns dos que me criticaram desde o princípio, talvez comecem agora a perceber porque é que eu não acreditei nesta Europa imposta, e porque é que se continua a insistir em medidas absolutamente ilógicas para resolver os problemas económicos dos países que estão em dificuldades. 

A solidariedade deu lugar à lei da selva, e os países do sul da Europa estão a ser “empurrados” para o papel de reservas de mão-de-obra barata para a produção de bens concorrenciais com a produção dos países emergentes. 


quarta-feira, julho 18, 2012

SEREMOS RICOS?

Esta pergunta é mais pertinente do que possa parecer a alguns de nós, porque o fisco usa critérios que são muito difíceis de compreender. 

Comecemos por falar do IRC, cuja receita arrecadada diminuiu, talvez porque apenas menos de 1/3 das empresas o terem pago. Seguindo pelo IRS temos que as receitas subiram, e 46% das famílias que entregaram a declaração, pagaram o imposto. 

Pelos vistos os trabalhadores estão mais sujeitos a serem taxados do que as empresas, e acabam por pagar mais impostos. Os ímpetos liberais do nosso 1º ministro e a lógica da nossa máquina fiscal está a falhar no alvo, ou então é propositadamente injusta. 

Claro que não temos por cá um Warren Buffet para dizer que os capitais pagam muito pouco e que o trabalho paga demasiado. Por cá até se critica o Presidente do Tribunal Constitucional por sugerir que se taxem mais os capitais, porque os ricos cá do sítio querem continuar a pagar baixos salários e menos impostos, e pelos vistos conseguem com governantes como os que temos tido. 

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segunda-feira, julho 16, 2012

FUTURO MAIS QUE CINZENTO

Costumo ser optimista em muitas coisas, e creio ser desenrascado em muitas outras, mas quando se trata de política e especialmente da cá do burgo, fico logo pessimista. 

Acabei de ler a notícia sobre uma sondagem feita pelo Jornal de Negócios e fiquei céptico também quanto à sondagem que, segundo eles diz que a maioria dos portugueses prevê que a situação se deteriore em 2013, mas em relação aos próximos três anos a confiança melhora. 

A primeira parte da conclusão é óbvia, já a segunda é muito pouco provável. Já há alguns anos que eu ouço dizer que pior do que aquilo que temos agora é impossível, mas a verdade é que há sempre alguém pior preparado para suceder ao mau que temos. 

Para que conste, e sem qualquer receio de ser chamado desiludido, recordo que uma outra sondagem dum jornal grego diz que “maioria dos gregos defende renegociação (do memorando) mesmo que implique a saída do euro”. 

Como sabemos a Grécia começou um pouco mais cedo a obedecer à troika e a implementar a austeridade duma forma violenta, e o resulta é o que conhecemos, e que deveremos alcançar daqui a um ano, se as coisas não mudarem. 

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By Toso Borkovic

sábado, julho 14, 2012

À CONVERSA

Continuo a ser frequentador do café cá da zona porque é o sítio onde se encontram os vizinhos fora das horas de trabalho. Uns trabalham, outros já estão reformados mas todos aproveitamos para dar dois dedos de conversa, falando de tudo um pouco. 

Nesta última noite a conversa pendeu para o as conversas sobre o trabalho e sobre os chefes e, curiosamente, a história mais eloquente veio da boca do Necas, que se reformou recentemente. 

Dizia o Necas que o seu último chefe, que teve que gramar durante 9 longos anos, ara um especialista em dar mão-de-vaca aos subordinados sempre que o serviço era alvo de alguma reclamação, mesmo que o motivo fosse da sua inteira responsabilidade. Numa destas ocasiões, nem se eximiu de passar uma reprimenda injusta, na presença do superior máximo da empresa ao funcionário mais velho da casa, por acaso seu antecessor no cargo. 

O Necas, que sempre foi parco em palavras, mas duro no uso da palavra, como bom transmontano, saiu em defesa do colega e atirou ao chefe: O senhor que me desculpe pelo comentário, mas um chefe que se escuda sempre atrás da incompetência dos subordinados, é alguém que não foi capaz de conseguir aproveitar as qualidades, nem motivar suficientemente aqueles que é suposto dirigir. O senhor está portanto a falar contra si próprio. 

A partir daí o Necas foi colocado na prateleira e reformou-se, pois a verdade não é apreciada e as chefias incompetentes são frequentemente premiadas, como o próprio fez notar

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Black White by dingbat23

quinta-feira, julho 12, 2012

HUMOR CORROSIVO

A acção de Vítor Gaspar no executivo de Passos Coelho tem sido alvo de inúmeros reparos, que nem sempre lhe são favoráveis. Enquanto ao 1º ministro muitos lhe atribuem uma agenda política, em que a destruição do Estado está demasiado evidente, ao ministro das Finanças é mais comum ser criticado pelo seu seguidismo relativamente à Alemanha. 

Esta semana tivemos entre nós o jornalista do Finantial Times, Martin Wolf, que com o seu fino humor britânico, classificou muito bem Vítor Gaspar, ao dizer que ele “é um tecnocrata muito capaz, um economista muito capaz, integralmente alinhado com o consenso europeu sobre política monetária e orçamental e, portanto, uma pessoa muito adequada para levar a cabo políticas que foram decididas noutros lugares”. 

Penso que depois desta classificação feita por um especialista na matéria, insuspeito de estar subordinado a qualquer interesse partidário nacional, não será preciso dizer mais nada, senão notar que existe uma forte possibilidade de poder vir a ser escolhido para um alto cargo europeu, exactamente por uma das características aqui mencionadas.

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quarta-feira, julho 11, 2012

FACTOS INCONVENIENTES

Passos Coelho pode dizer o que quiser, mesmo que seja que os sacrifícios são para todos e o seu governo está preocupado com o país e com os portugueses, mas há factos que o contrariam e que ele não pode negar. 

Quando o 1º ministro fala em direitos adquiridos, não fala de todos os direitos e de toda gente, mantendo sempre o discurso ao nível dos salários, como se assim estivesse a repartir equitativamente o esforço. A frase que mencionou no debate do Estado da Nação, hoje na AR, de que “não há direitos constituídos ou adquiridos que não devam ceder perante uma situação de emergência”, citando o Tribunal Constitucional, não é seguida pelo seu governo. 

Vem a propósito lembrar que já criou uma taxa que incidia sobre os subsídios de Natal dos trabalhadores por conta de outrem em 2011, já cortou salários da função pública acima de determinado montante, já cortou os subsídios de férias e de Natal dos funcionários e dos pensionistas e já sugeriu vir a cortar a todos os trabalhadores, do sector público e do sector privado para compensar os cortes inconstitucionais feitos este ano, que está proibido de repetir a partir do final do ano. 

Podia ter sido mais exaustivo falando dos cortes das prestações sociais, nos direitos laborais, etc., mas nem é preciso para se notar o contraste com a ausência de cortes noutro tipo de contratos e de direitos deles decorrentes, nas rendas excessivas das PPP, por exemplo. Para estes já vieram membros do governo e da maioria dizer que não se pode mexer nos contratos sob pena de ter de se pagar indemnizações elevadas. 

A desigualdade de tratamento é gritante, porque uns não têm direitos adquiridos porque existe uma emergência, outros têm direitos adquiridos mesmo em situações de emergência. Passo Coelho devia ter muito cuidado em citar o que o TC escreveu, porque em matéria de igualdade de tratamentos estamos falados. 

Pode também ler ISTO 
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terça-feira, julho 10, 2012

CADEIRAS

Apesar das notícias sobre cadeiras serem muitas, e até algumas bem picantes, eu hoje saliento a exposição “Art on Chairs” que vai estar dois meses em Paredes e é a parte de responsabilidade social mais alargada, o Pólo do Design de Mobiliário de Paredes. 

Vão estar expostas 11 cadeiras desenvolvidas para personalidades nacionais e estrangeiras por conhecidos designers. As receitas de alguns exemplares, que vão ser leiloados, revertem integralmente para a ajuda através do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. 

Sem qualquer relação com o referido exame mas porque menciona a palavra cadeira, resolvi colocar aqui um boneco do nosso ilustrador de serviço.

segunda-feira, julho 09, 2012

CHANTAGEM INDECENTE

Com o chumbo, ainda que parcial, dos cortes dos subsídios de férias e de Natal, por manifesta inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, o governo tem vindo a sugerir outros cortes, dizendo que são uma consequência daquela decisão. 

Já se ouviu dizer que estava a ser ponderada a hipótese de se aplicarem os cortes de 7% a todos os trabalhadores, já se ouviu falar de despedimentos na função pública, e até já se fala de cortes na saúde e na educação. 

Para mim são ameaças claras, umas feitas por membros do governo, outras ditas pelos comentadores de serviço ao poder, a ver se com um clima de medo instalado a decisão será menos contestada. Tudo tem sido apresentado como inevitabilidades. 

Passos Coelho veio ainda lançar um repto ao PS, para este dizer então onde se pode cortar. Claramente há aqui um problema de audição ou de profunda hipocrisia, pois a oposição tem vindo a sugerir outros cortes, só que como não são dirigidos ao factor trabalho, Passos Coelho não os deve ter ouvido. 


domingo, julho 08, 2012

QUAL ASSUNTO?

O caos da licenciatura de Miguel Relvas foi classificado por Passos Coelho como um não-assunto, mas a verdade é que continua a encher páginas de jornais e a merecer a saída de comunicados, notícias e desmentidos, provando que ainda mexe. 

O que aconteceu com o curso de José Sócrates repete-se agora com poucas diferenças. A dúvida sobre o canudo existe e o processo de obtenção do mesmo é simplesmente estranho. 

Talvez poucos se recordem do que Passos Coelho, que agora diz que este é um não-assunto, disse sobre as Novas Oportunidades, mas eu passo a citar: ”é um certificado à ignorância”. Tratava-se da certificação de competências dos candidatos, avaliadas por um júri. 

Há frases que podem ser consideradas assassinas e a do “certificado à ignorância”, proferida por Passos Coelho é com toda a certeza uma delas. 

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Sabedoria
Gráfico

sábado, julho 07, 2012

ALI NÃO HAVIA ELECTRICIDADE


Ali não havia electricidade.
Por isso foi à luz de uma vela mortiça
Que li, inserto na cama,
O que estava à mão para ler —
A Bíblia, em português (coisa curiosa!), feita para protestantes
E reli a «Primeira Epístola aos Coríntios».
Em torno de mim o sossego excessivo de noite de província
Fazia um grande barulho ao contrário,
Dava-me uma tendência do choro para a desolação.
A «Primeira Epístola aos Coríntios»...
Relia-se à luz de uma vela subitamente antiquíssima,
E um grande mar de emoção ouvia-se dentro de mim...
Sou nada...

Sou uma ficção...
Que ando eu a querer de mim ou de tudo neste mundo?
«Se eu não tivesse a caridade».
E a soberana luz manda, e do alto dos séculos,
A grande mensagem com que a alma é livre...
«Se eu não tivesse a caridade»...
Meu Deus, e eu que não tenho a caridade!...

Álvaro de Campos 1934

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quinta-feira, julho 05, 2012

RETROCESSO CIVILIZACIONAL

Quando ouvia esta tarde uma senhora deputada do CDS dizer que a despenalização do aborto não tinha sido um avanço civilizacional, mostrando-se contra a interrupção voluntária da gravidez dentro dos prazos legais, fiquei a pensar que ainda há muita gente neste país que não conhece a realidade da miséria que infelizmente aumenta neste país. 

O que faria a senhora deputada caso recebesse o salário mínimo nacional e tivesse o marido desempregado, e tivesse a azar de engravidar? É que a prevenção da gravidez existe, mas nem é infalível nem é seguida à risca por uma parte das mulheres desfavorecidas. Podia até invocar as razões religiosas, já que a senhora deputada é dum partido onde militam bastantes católicos, que seguem à risca (?) os ensinamentos da igreja. 

Penso que o argumento mais apropriado é o que resulta da análise de uma notícia que divulga o facto de terem diminuído no primeiro semestre deste ano, pelo menos 4 mil nascimentos, relativamente ao ano anterior. As razões são óbvias, e resultam das medidas de austeridade impostas por este governo, onde pontua o CDS. 

Não há ninguém, muito menos uma mãe, que possa sentir satisfação com um aborto, mas há bastantes circunstâncias que podem levar uma pessoa a tomar essa penosa decisão, e não serei eu que lhe atirarei a 1ª pedra. As alternativas são todas piores, quer seja o abandono puro e simples, quer seja o aborto clandestino. 

O que seria para a senhora deputada um avanço civilizacional nesta matéria, com as condições actuais em que (mal) sobrevivem muitas famílias? 

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quarta-feira, julho 04, 2012

AS NOVAS OPORTUNIDADES DOS POLÍTICOS

Já foi sobejamente discutido o caso da licenciatura de José Sócrates numa universidade que trabalhava aos domingos e que permitia exames (?) enviados por fax, e creio que quase toda a gente ficou com a impressão que a licenciatura era muito manhosa, mas que para o caso não tinha importância nenhuma. 

O mesmo José Sócrates até era o “mentor” das Novas Oportunidades, que visavam qualificar e reconhecer essa qualificação pelo menos até ao 12º ano de escolaridade, por isso ficava-se com a impressão que para os políticos, a oportunidade seria “estendida” até à licenciatura. 

Não estavam enganados os que assim pensavam, pois pelas explicações dadas pelo ministro Miguel Relvas, fica-se a saber que afinal em pouco mais de um ano houve quem conseguisse uma licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais, pois terá sido “encurtada por equivalências reconhecidas e homologadas pelo Conselho Científico da referida universidade (Lusófona) em virtude da análise curricular a que precedeu previamente”. 

Claro que não sou ninguém para duvidar da palavra do ministro nem dos professores da Lusófona à época, como por exemplo o seu actual secretário de estado adjunto, Feliciano Barreiras Duarte. O que me parece estranho é o facto de Miguel Relvas não concordar inteiramente com as Novas Oportunidades. É estranho, não é?

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segunda-feira, julho 02, 2012

POEMA

O Encoberto



Cavaleiro do Sonho e do Desejo,
guarda no santo Graal,
com a nossa Saudade e o nosso Beijo,
- o sangue de Portugal.

Sonho de além e de glória,

há tanto, há tanto
o sonha um Povo inteiro!
Maravilha e encanto
da nossa história:
- oh Manhã de Nevoeiro...

Oh manhã misteriosa

que alvoreces em nós teu rompante claror,
teu messiânico alvor,
manhã de além, alva saudosa,
- tu és nossa força que não passa,
teu sonho em nós revive ao longe e ao perto,
manhã sem dia, oh manhã de Graça,
em que há de vir o Encoberto...

Místico Paladino iluminado,

que ao areal arrastou nossa alma em flor
e jogou a sorrir nosso destino e sorte,
ele era vivo antes de Desejado,
ele era vivo em nosso sonho e amor,
- e nunca o levou a morte!

Ele é vivo e é eterno! Horas ansiadas

em que o sinto, no meu sangue, em mim...
Ele vive nas Ilhas Encantadas
da nossa alma sem fim...

E, oh maravilha!

em toda a hora do perigo e do temor,
o Encoberto volta da sua Ilha,
e salva-nos, e salva-nos, Senhor!...

E a Esperança imortal,

surda palpita na manhã rompente!
Cerra-se a névoa alucinadamente,
Portugal boia no nevoeiro...

E o Cavaleiro

do Sonho e do Desejo
guarda no Santo Graal,
com a nossa Saudade e o nosso Beijo,
- o sangue de Portugal.




(In Ilhas de Bruma)