domingo, abril 29, 2012

O BANQUETE DAS HIENAS

O caso BPN é já reconhecidamente a maior fraude bancária de todos os tempos em Portugal. O montante das perdas é ainda uma incógnita, e os governantes têm vindo a esconder da opinião pública o total dos encargos envolvidos nas operações de nacionalização e de venda deste banco. 

O banquete das hienas, e foram muitas, que lucraram com esta monumental fraude, começou há vários anos, e os suspeitos vão desde os gestores do BPN e da SLN, à autoridade que devia fiscalizar o banco, a políticos, e a grandes empresas que também entraram no bodo dos últimos dias do banco. 

Os montantes envolvidos nesta fraude podem ir até aos 8,3 mil milhões de euros, segundo algumas opiniões, montante três vezes superior às economias feitas num ano com os cortes dos subsídios dos funcionários públicos e pensionistas. Pode dizer-se que este esforço exigido a estes dois grupos foi apenas para pagar o tal banquete de hienas. 

Quando se pergunta quem foram os responsáveis por esta monumental fraude, ficamos praticamente sem respostas, já que para além de Oliveira e Costa, parece que mais ninguém teve culpas no cartório, ou então são tantos e tão poderosos que nunca serão se fará Justiça. 

Podem não ser encontrados culpados, que é o mais provável, mas sabe-se bem quem foram os castigados, mesmo que nunca se tenham sentado à mesa com as hienas.

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By Carlos Quandt

sábado, abril 28, 2012

HUMILHAÇÃO

Há quem diga que os sacrifícios são necessários, que são impostos pela troika, que não se está a ir além do que a troika recomendou. Outros dizem que se está a ir para além do que a troika estipulou, e que já se ultrapassou o limite do aceitável. 

A austeridade em si mesma não leva à solução dos nossos problemas, pelo contrário agrava-os começando pelo desemprego e continuando pelo definhar da economia. Agora que são evidentes os resultados desta austeridade tão do agrado da senhora Merkel, já se ouve não só o senhor Stiglitz, mas até empedernidos apoiantes da receita, a proclamar que continuando a seguir esta receita a própria Europa caminha para o suicídio. Entretanto aqui em Portugal os trabalhadores continuam a ser humilhados, com aumentos de impostos e taxas, perdas de direitos laborais e sociais, e cortes nos salários como se fossem eles os responsáveis pelo estado a que o país chegou. 

Nas cadeiras do poder, político e económico, revezam-se os mesmos que levaram o país quase que à bancarrota, impávidos e serenos como se não tivessem culpas no cartório. Saltam de um poleiro para o outro sem nunca serem responsabilizados pelo mal que fizera. 

Triste povo este que não condena quem nos desgraçou e se verga aos discursos de inevitabilidades e de emergência nacional, sem se revoltar e gritar bem alto o que lhe vai na alma. A dignidade deste povo está a ser espezinhada, só não se sabe é por quanto tempo mais.

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quinta-feira, abril 26, 2012

POEMA DO SILÊNCIO

 
Sim, foi por mim que gritei.
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.

Foi em meu nome que fiz,

A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que não vi serem necessárias e vós vedes.

Foi quando compreendi

Que nada me dariam do infinito que pedi,
-Que ergui mais alto o meu grito
E pedi mais infinito!

Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas,

Eis a razão das épi trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...

O que buscava

Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febres de Mais. ânsias de Altura e Abismo,
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.

Que só por me ser vedado

Sair deste meu ser formal e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!

Senhor meu Deus em que não creio!

Nu a teus pés, abro o meu seio
Procurei fugir de mim,
Mas sei que sou meu exclusivo fim.

Sofro, assim, pelo que sou,

Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir.
Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!

Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação!

(Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...)
Senhor dá-me o poder de estar calado,
Quieto, maniatado, iluminado.

Se os gestos e as palavras que sonhei,

Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!

Ah! também sei que, trabalhando só por mim,

Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.

Mas o meu sonho megalómano é maior

Do que a própria imensa dor
De compreender como é egoísta
A minha máxima conquista...

Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros

Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu Silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...

Sim, descerá da tua mão compadecida,

Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome
.

José Régio



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quarta-feira, abril 25, 2012

TOURADA

Não importa sol ou sombra 
camarotes ou barreiras 
toureamos ombro a ombro 
as feras. 
Ninguém nos leva ao engano 
toureamos mano a mano 
só nos podem causar dano 
espera. 

Entram guizos chocas e capotes 
e mantilhas pretas 
entram espadas chifres e derrotes 
e alguns poetas 
entram bravos cravos e dichotes 
 porque tudo o mais 
são tretas. 

Entram vacas depois dos forcados 
que não pegam nada. 
Soam brados e olés dos nabos 
que não pagam nada 
e só ficam os peões de brega 
cuja profissão 
 não pega. 

Com bandarilhas de esperança 
 afugentamos a fera 
estamos na praça 
da Primavera.

Nós vamos pegar o mundo 
pelos cornos da desgraça
 e fazermos da tristeza 
 graça. 

Entram velhas doidas e turistas 
entram excursões 
entram benefícios e cronistas 
entram aldrabões 
entram marialvas e coristas 
 entram galifões 
de crista.

Entram cavaleiros à garupa 
do seu heroísmo 
entra aquela música maluca 
do passodoblismo 
entra a aficionada e a caduca 
mais o snobismo 
e cismo...

Entram empresários moralistas 
entram frustrações 
entram antiquários e fadistas 
 e contradições 
e entra muito dólar muita gente 
que dá lucro a milhões. 

E diz o inteligente
que acabaram as canções.

.

terça-feira, abril 24, 2012

EXCESSO SECURITÁRIO

Os portugueses gostam de segurança, e isso é bem patente a todos os níveis, não só segurança pública, mas também segurança no emprego e segurança social. Sendo que irei falar de segurança pública, talvez seja bom recordar que tanto a segurança no emprego como a segurança social deixaram de existir, em grande medida por decisões várias deste governo. 

Se os portugueses são em regra pacatos e respeitadores da ordem pública, não se percebe muito bem o discurso das autoridades de segurança, ao dizerem que a polícia se prepara para ter tolerância zero nas manifestações do 25 de Abril. 

Não sei se houve intenção de copiar a frase de Paulo Portas, usando “a tolerância zero” para agradar ao ministro, mas a frase é absolutamente desadequada tendo em conta a prática. As autoridades policiais deviam ter alguma contenção nas palavras pois fizeram-nos recordar actuações recentes que pecaram por ser excessivas. 

A segurança não advém de discursos e poses agressivas mas sim de prevenção, e não é preciso ser-se especialista para o saber. Com este tipo de discurso criam-se resistências que bem se podiam evitar. 

Os portugueses gostam de segurança mas detestam um Estado securitário, e digo-o não porque estamos em vésperas do 25 de Abril mas porque está mais do que provado.

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domingo, abril 22, 2012

POESIA

Dois Rumos

Mentir, eis o problema: 
minto de vez em quando
ou sempre, por sistema? 

Se mentir todo dia, 
erguerei um castelo 
em alta serrania

contra toda escalada, 
e mais ninguém no mundo 
me atira seta ervada? 

Livre estarei, e dentro 
de mim outra verdade 
rebrilhará no centro? 

Ou mentirei apenas 
no varejo da vida, 
sem alívio de penas, 

sem suporte e armadura 
ante o império dos grandes, 
 frágil, frágil criatura? 

Pensarei ainda nisto. 
Por enquanto não sei 
se me exponho ou resisto, 

se componho um casulo 
e nele me agasalho, 
tornando o resto nulo, 

ou adiro à suposta 
verdade contingente 
que, de verdade, mente. 

Carlos Drummond de Andrade
 
Lábia by Goran Divac

sábado, abril 21, 2012

ESTAMOS NA BANCARROTA

A afirmação não é minha mas sim da senhora ministra da Justiça, que justificava assim a necessidade do corte dos dois subsídios aos funcionários públicos e pensionistas.

Disse a ministra que percebe a “dor” e que é impossível não o perceber quando um casal de funcionários públicos fica com menos quatro subsídios e menos 20% do rendimento. No entanto acrescentou também que «não é possível no âmbito do programa de assistência financeira nem no tempo exigido pelo programa de assistência financeira» porque «o país chegou, de facto, à bancarrota».

Estas afirmações acompanham uma inadmissível sentença na boca de um membro do governo, ao afirmar que um chumbo do Orçamento de Estado pelo Tribunal Constitucional (TC) «traria consequências complicadas para a sustentabilidade de Portugal».

Este condicionamento dos membros do TC, ao acenar com uma catástrofe para o país, é simplesmente contraditória com a independência dos juízes do TC, e a separação de poderes, desde logo ameaçada pelo método de escolha dos mesmos, como está a acontecer neste preciso momento.

O governo de que faz parte a ministra Paula Teixeira da Cruz, devia ter ponderado muito bem antes de se decidir pelos cortes selectivos dos subsídios aos funcionários públicos e pensionistas, e não teria ido claramente contra a Constituição, como obviamente o fez. O chumbo pelo TC é inevitável, e se porventura não acontecer, será o descrédito total da instituição, ficando provada a dependência deste órgão ao poder político que nomeou a maior parte dos seus membros.

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Justiça e Política de Braço Dado

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By Palaciano

quinta-feira, abril 19, 2012

BASTA DE MENTIRAS

É confrangedor constatar o distanciamento existente entre os membros do governo e os governados. Do alto da sua torre de marfim e escudados em títulos pomposos estes senhores desconhecem a realidade do dia-a-dia do povo simples e trabalhador.

Há exemplos absolutamente lapidares do desconhecimento do sentimento popular, como por exemplo o do ministro das Finanças, Vítor Gaspar que foi dizer para os EUA que em Portugal as pessoas “estão completamente dispostas a fazer sacrifícios” desde que sintam que existe justiça nos mesmos.

O primeiro-ministro, que não podia ficar para trás, também afirmou em Londres que foi a proximidade do 1º de Maio que precipitou o “debate” sobre o acordo de concertação social e a ameaça da UGT de denunciar o acordo.

Outra afirmação demonstrativa do seu desconhecimento da realidade foi a propósito das compensações por despedimento, quando o governo veio a terreiro dizer que “os países desenvolvidos” têm níveis mais baixos de compensação e critérios de elegibilidade mais exigentes.

Eu duvido muito que exista tanta ignorância entre os nossos governantes, e atribuo estas afirmações a um comportamento compulsivo de mentir sistematicamente sobre a realidade, que os leva a crer nas suas próprias afirmações.

Os cidadãos que votaram nos partidos do poder foram enganados pelas suas promessas, e a vasta maioria dos restantes simplesmente não lhes deu o seu voto. Está mais do que demonstrado, até pelas sondagens de que tanto gostam os políticos, que os portugueses não acham que haja justiça na aplicação dos sacrifícios exigidos. A UGT que não passa duma central sindical conotada com os partidos do poder, sabe que ao assinar o acordo de concertação social atraiçoou os seus poucos apoiantes.

Para finalizar, basta de mentiras. É tempo de dizer bem alto que os países com maior produtividade, com cidadãos mais felizes e com melhor nível de vida, são países onde as preocupações sociais e os sistemas de segurança social são maiores e mais fortes. O desenvolvimento social e económico não se faz à custa dos direitos dos trabalhadores mas sim com mais justiça social e melhor redistribuição da riqueza nacional.

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Praga

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